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segunda-feira, 22 de novembro de 2010

ARTIGO: Educação Inclusiva e Deficiência Visual: Algumas Considerações

Educação Inclusiva e Deficiência Visual: Algumas Considerações
Inclusive Education and Visual Impairment: Some Considerations

Bento Selau
Carlise Inês Kronbauer
Priscila Pereira

 Resumo
 Põe-se em questão o trabalho pedagógico na perspectiva inclusiva, mormente para as crianças com deficiência visual. Tem-se como propósito perceber as possibilidades educativas de criar e recriar das pessoas visualmente normais, ao lado de alunos com deficiência da visão, pessoas estas que são parte real de um complexo processo de mudanças na escola, geradas em meio a incertezas, vontades e esperanças.

 ABSTRACT
 The pedagogical work is here called into question from the inclusive perspective, mainly for children with visual impairment. Its purpose is to perceive the educational possibilities of creating and recreating in sighted people, together with those of visually impaired students, persons who are real parte of a complex process of school changes, which are generated among uncertainties, wills and hopes.

           A proposta da educação inclusiva não trata de colocar na escola regular parcelas de alunos da educação especial, mas, oferece oportunidades para que todas as crianças tenham possibilidades reais de construção do seu conhecimento, interagir com outras, desenvolver suas potencialidades, preparar-se para a vida, a independência e a liberdade para viver e conviver em sociedade. Isso indica que as pessoas com deficiência visual1 devem ter garantido seu espaço na escola, substancialmente com uma proposta pedagógica que dê conta das necessidades que alunos ditos normais e alunos com deficiência visual juntos, em uma sala de aula, demandam.
      Assim, põe-se em questão o trabalho pedagógico na perspectiva inclusiva, mormente das crianças com deficiência visual no espaço educativo. Tem-se como propósito perceber o conjunto de possibilidades educativas de criar e recriar dos alunos visualmente normais, e ao lado de alunos com deficiência da visão, uma vez que são parte real de um complexo processo de mudanças, geradas em meio a incertezas, vontades, angústias e medos. Este caminho, guia-se pela vivência  de Carlise Inês Kronbauer enquanto pessoa cega e seu interesse e aprofundamento teórico por essa área de estudo.Os depoimentos de sua trajetória pessoal na escola regular conferem valor ao artigo. O trabalho leva em conta a experiência de Bento Selau como professor da Educação Básica e Superior que se envolve com alunos em educação inclusiva e pesquisador interessado nos estudos desta área. Priscila Pereira contribui com seus estudos sobre o Projeto Mecdaisy e o trabalho que tem realizado em sua iniciação científica.
       Para que se possa compreender melhor a temática que se propõe, serão revistos alguns pontos, que tratam principalmente sobre: a importância do trabalho em grupo em sala de aula para todos os alunos; a tarefa docente e suas especificidades; as necessárias adaptações pedagógicas; o acesso ao mundo “virtual”. As discussões apresentadas não pretendem encerrar o assunto, pelo contrário: o debate está aberto e suscita ainda diversos estudos e, sobretudo, a prática inclusiva para todos os estudantes.
Importância  do trabalho em grupo na sala de aula
        O trabalho em grupo na sala de aula é significativo para todos os alunos, principalmente quando se têm alunos com necessidades educacionais especiais com deficiência visual. O pensamento sobre grupos se aproxima das idéias de Vygotski (1997). Os escritos deste autor apontam a função importante do social  na  conformação das  funções psíquicas superiores2, independentemente se estas funções estejam presentes em pessoas consideradas normais ou pessoas mentalmente deficientes. Tal  força  tem o  relacionamento com os outros que, segundo Vygotski, em primeiro lugar, a função psíquica aparece no processo de desenvolvimento como função da conduta coletiva, como forma de colaboração ou interação com os demais para, em segundo lugar, aparecer como processo interior. A noção sobre a importância da formação de grupos em educação inclusiva foi defendida recentemente por Selau que aponta que
se os alunos se envolverem, trocarem informações, participarem juntos em atividades, está-se posto um momento importante para o desenvolvimento das crianças, principalmente para aquela que tiver alguma necessidade especial. Por isto acredita-se que a educação escolar inclusiva que não fomente a colaboração entre seus participantes pouco valor tem (2007, p. 10).
     Especificamente, para a criança com deficiência visual, Vygotski (1997) cita que a falta de visão não é impedimento para que ela desenvolva domínios conceituais. Afirma que não serão os exercícios táteis que possibilitarão a construção das representações mentais: mais do que isto, é importante o estabelecimento de círculos estáveis de interação social, através dos quais os conceitos serão desenvolvidos. Assim, “el concepto (...), como todos los procesos psicológicos superiores, no se desarrolla de otro modo que en el proceso de la actividad colectiva del niño3” (VYGOTSKI, 1997, p. 230).
      Será que estas noções teóricas estão sendo levadas em conta quando se organiza a atividade das crianças na sala de aula no ensino regular com a presença de crianças cegas? A vivência de Carlise oferece algumas noções que indicam que esta é uma preocupação que deveria estar mais presente durante o planejamento de ensino dos docentes:
No ensino regular os professores passavam a matéria no quadro e não trabalhávamos muito em grupo. Eu escrevia lentamente em braille, com reglete, e não conseguia acompanhar os colegas. Então, pegava um caderno emprestado e copiava em casa, ou tirava xerox, práticas que não oportunizavam as interações sociais que, mais tarde, pude vivenciar no Ensino Superior.
    Propor que os alunos trabalhem em grupos não significa anular outros tipos de organização social das atividades escolares. Os métodos de ensino devem se adequar às capacidades dos alunos, ao conteúdo de cada disciplina e garantir a atividade dos estudantes. Nesse sentido, é importante que sejam alternados o trabalho individual e o trabalho em grupo, exigindo-se, no trabalho individual, que cada um enfrente os desafios com seus recursos, limites e possibilidades e que, no trabalho em grupo, ao mesmo tempo em que se revelem as capacidades intelectuais, sejam reveladas também as sociais, no desenvolvimento da responsabilidade perante o trabalho coletivo e no auxílio aos demais colegas. Estas noções são importantes, também, para as pessoas cegas, mesmo se utilizam, muitas vezes, recursos diferenciados para sua aprendizagem, tais como programas leitores da tela do computador e escritos em braille.
A tarefa docente
     No atendimento às necessidades especiais das pessoas cegas na escola regular é indispensável que instituição e professor se organizem para recebê-las, pois a simples  presença  de  uma  criança  com  deficiência visual em sala de aula não configura a inclusão que se propõe com esperada qualidade. Deve haver a preocupação com os conhecimentos com os quais esta criança vai lidar, com a interação com os colegas  e  professores,  com  o  deslocamento  da  criança pela sala de aula, pela escola, no relacionamento com as famílias, com a proposta pedagógica, com a formação dos professores. Sem uma estrutura racionalmente organizada para tal, podem ocorrer situações desnecessárias ou até mesmo constrangedoras, que não auxiliam o processo educativo do aluno cego nem mesmo dos demais estudantes. Carlise relata exemplos práticos de um processo pedagógico não muito bem elaborado:
Quando era estudante da Educação Básica, possuindo baixa visão, vivenciei constrangimentos causados por práticas pedagogicamente incorretas: ser orientada a localizar informações em mapas expostos no mural da sala de aula, situação acompanhada pela repreensão da professora, pelo fato de não conseguir atender à sua expectativa e chacotas de colegas insensíveis à minha deficiência; sem contar as ocasiões em que, já com a perda total da visão, os professores, sem aviso prévio, apresentavam materiais em vídeo legendado, sem a devida tradução oral dos mesmos. À época, sentia-me entristecida, mas, por não saber defender meus direitos e propor alternativas, mantinha-me passiva ante a situação.
   Situações como as descritas apontam para a necessidade de formação dos professores, aspecto este que merece ênfase quando se aborda a inclusão. Muitos professores sentem-se inseguros e ansiosos diante da possibilidade de receber uma criança com necessidades especiais na sala de aula. Há uma queixa geral de estudantes de licenciaturas e professores: “Não fui preparado para lidar com crianças com deficiências!” Contudo, na última década, a formação de professores para a educação inclusiva tem recebido mais atenção e estímulo, seja por meio de modalidades de educação à distância, formação continuada ou formas de estímulo à autonomia intelectual do professor. No cerne da formação, torna-se necessário explicitar os conceitos de inteligência, ensino e aprendizagem. Os docentes precisam desenvolver a concepção da inteligência humana, entendendo-a como um processo mutante e sócio-histórico; de um ensino capaz de alcançar todos os participantes de uma sala de aula; de aprendizagem compreendida como atributo de qualquer pessoa, independente das suas potencialidades ou dificuldades, assim considerando que qualquer pessoa aprende.
     O aprofundamento teórico do professor deve decorrer, inicialmente, da necessidade que a prática na sala de aula impõe, das demandas concretas de alunos que já estão inseridos nela. O professor não tem como saber, “a priori”, tudo sobre todas as deficiências, para atender qualquer aluno que procure a escola, mesmo porque as características das deficiências mudam e se alteram conforme o indivíduo. Não se pode afirmar que a experiência direta e a interação com pessoas com deficiência visual sejam requisitos prévios para o desenvolvimento do processo de inclusão em uma escola, no entanto ela pode favorecer a eliminação de alguns preconceitos. É fundamental, nesse sentido, que cursos de formação de educadores propiciem o contato com pessoas com necessidades especiais, por meio da realização de estágios em escolas inclusivas ou a instituições especializadas, e entrevistas com pessoas especiais que obtiveram êxito no percurso escolar ou profissional e que possam apresentar testemunhos sobre suas trajetórias e seus problemas no contexto escolar.
    Reitera-se, como ponto de partida, o estímulo a uma disposição humanitária inicial do educador. Essa disposição inclui considerar o outro como pessoa, sujeito e cidadão, com direito à escolarização e a viver plenamente. Essa atitude é imprescindível. Ela não pode ser confundida com o assistencialismo, implícito no impulso de “querer ajudar o outro”, muitas vezes, erroneamente associado à educação inclusiva. A visão assistencialista não concebe a relação com a pessoa com deficiência como uma via de mão dupla, e sim como um “dar de si” ao outro, considerado menos capaz ou menos válido. Portanto, é essencial que os professores reconheçam sua própria importância no processo de inclusão, pois a eles cabe planejar e implementar intervenções pedagógicas que dêem sustentação para o desenvolvimento das crianças.
    A insegurança de muitos professores, associada ao despreparo profissional, são fatores que necessitam ser equacionados e superados. Portanto, a efetivação plena e permanente do processo inclusivo depende muito da atuação e das atitudes dos professores e do acesso a novas informações. É indispensável ainda, a construção de grupos de estudos a respeito da temática da inclusão nas escolas, para os professores compreenderem melhor a deficiência visual e saberem perceber a diferença, por exemplo, entre pessoa cega e com baixa visão e entenderem que esta última também traz grandes limitações sensoriais.
Adaptações pedagógicas
     A educação de pessoas com deficiência visual exige alguns recursos específicos que viabilizam seu acesso ao mundo cultural e científico. É importante que estes recursos possam estar associados à educação destas na escola comum e que envolvam, desde aspectos cotidianos das relações interpessoais, até o uso do computador como ferramenta indispensável.
     O material didático, para os alunos cegos, deve ser em braille e em relevo e cores contrastantes, para os alunos com baixa visão, em tipos ampliados. Muitos materiais pedagógicos adaptados às pessoas cegas podem ser adquiridos em lojas especializadas, não necessitando ser produzidos pelos professores. Alguns destes devem ser adaptados: uma bola deve conter um guizo interno; devem ser usadas ilustrações em relevo para auxiliar a compreensão de um tema; mapas em alto-relevo e braille para auxiliar o ensino da Geografia, bem como tabelas periódicas e livros em braille ou digitalizados. Todo o material apresentado visualmente, independente da disciplina, deve ser acompanhado de explicações verbais para auxiliar a compreensão de quem não vê.
  Os alunos com deficiência visual podem apresentar dificuldades específicas em relação à aprendizagem da Matemática. Nesse sentido, é necessário que experimentem jogos ou brinquedos por meio dos quais poderão vivenciar a classificação, a ordenação por tamanho, a adição e a subtração, além da comparação entre objetos. É importante que a criança desenvolva a noção de conservação dos conjuntos, de equivalência e, progressivamente, de outras operações de base concreta, como suporte para posteriores abstrações. O uso do Soroban4 como um recurso educativo específico é imprescindível para a execução de cálculos matemáticos por alunos com deficiência visual.
    A escola deve ter materiais diversos que estimulem a percepção do aluno cego e também dos outros alunos, por meio de exercícios ou trabalhos comuns. O papelão grosso, a espuma, o tecido colorido, guizos, elástico, bolinhas, pompons, ripas de madeira, chocalho, feltro de várias cores, lã, fita, latas pequenas com tampas, tampinhas de bebida, velcro, luvas de plástico, sabonetes pequenos, argolas grandes e pequenas, E.V.A. (emborrachado) e vários outros materiais podem ser utilizados em atividades coletivas, relacionadas aos conteúdos do dia. Como se pode perceber, a estimulação do sistema tátil é importante para a aprendizagem da criança cega. Vários recursos podem ser associados à educação que ocorre na escola comum, por meio da modernização de recursos já existentes e de novas propostas educacionais, alguns deles, inclusive, produzidos com a participação das pessoas com deficiência visual. Masini (1997) aponta a predominância dos aspectos verbais e visuais nas comunicações. É necessário que o educador esteja atento aos canais perceptivos das pessoas cegas. Para que o aluno cego organize seu mundo, ele necessita interagir com os objetos e as pessoas, usando as habilidades táteis, olfativas, gustativas e auditivas, de forma que ele possa expressar sua experiência perceptiva.
    Muitas pessoas cegas têm desenvolvido suas potencialidades na leitura, na escrita, na fala e no diálogo com os outros e apresentam grande potencial escolar e desempenho eficiente. A ação educativa requer sensibilidade do educador para com o outro, observando suas ações, o que ele diz, como diz e, como ele se sente na situação: ansioso, relaxado, feliz.  Todo aluno deve ter possibilidade de expressar, para o professor e para o grupo, o que percebe, o que sabe e o que sente. Para as exposições de todos, ou dos que se propuserem a falar, o professor pode delimitar um tempo determinado. Para o aluno cego, a oportunidade de verbalizar em grupo pode lhe permitir compor as suas representações com as dos colegas. Masini (1997) dá destaque para a formação do autoconceito do aluno cego. Esse processo consiste na avaliação que a pessoa tem de si e que se forma na interação com os outros. Ele é baseado nas próprias experiências e percepções, assim como nas descrições dos outros. O autoconceito positivo revela elevada auto-estima e confiança em si; já o autoconceito negativo significa uma falta de confiança em si mesmo, além de não saber lidar com seus limites e possibilidades. Quando a sociedade expressa sentimentos que confirmam o outro como sujeito, na sua particularidade, ele forma um autoconceito positivo; se o negam, ele desenvolve um autoconceito negativo. Esse é um aspecto importante para o desenvolvimento de todas as crianças.
    Para o aluno com deficiência visual, há necessidade de contato e estimulação por meio dos sentidos remanescentes, evitando o sentimento de isolamento. É preciso falar com ele, mostrar-lhe os objetos através do toque, dizer qual é a sua cor, falar de cheiros. Ao procurar avaliar o seu processo de desenvolvimento e aprendizagem, ter como referência as suas potencialidades, não a comparação com as pessoas que enxergam. Para assegurar sua autonomia de registro e expressão, é importante estimular a pessoa cega a aprender o Sistema Braille.
    Na escola, o deslocamento do aluno com deficiência visual deve ser estimulado e facilitado dentro e fora da sala. O professor pode acompanhar ou sugerir que, no início, alguém o acompanhe (por exemplo, ao bebedouro), já que, num futuro próximo, ele o fará por si. Mover-se livremente no espaço, localizar lugares que não estão no campo visual e planejar trajetórias a serem percorridas são atividades de grande importância no dia-a-dia desse indivíduo. Deve haver todo um cuidado com os alunos cegos durante o intervalo das aulas. Neste sentido o professor, em acordo com os serviços da escola, precisa elaborar estratégias que facilitem não somente o deslocamento da criança cega no recreio, mas, também sua relação com os demais colegas e destes com ela, para que não fique isolada e aproveite este espaço como momento de fruição e prazer. Masini (1994) e Amiralian (1997) destacam a necessidade de compreender o sujeito deficiente visual a partir dos seus próprios referenciais e vivências. Para tanto, é indispensável uma maior interação com a pessoa com deficiência visual. Convivendo com elas e as observando, constata-se que buscam, por sua própria conta, desenvolver sua locomoção, independência e autonomia, melhorando, assim, a autoestima e conquistando espaços sociais importantes.
     A utilização de recursos pedagógicos diversificados para cada tipo de aluno é fundamental, considerando que as formas de aprendizagem e desenvolvimento diferem-se conforme as necessidades especiais de cada criança. A escola deve se propor como instrumento para o desenvolvimento humano: esse desenvolvimento pressupõe, basicamente, a integração entre as dimensões afetiva e cognitiva. A eficácia da ação educativa se fundamenta no conhecimento da natureza do aluno, de suas capacidades e necessidades.
O mundo “virtual”
   O acesso às novas tecnologias facilita os estudos das pessoas cegas e seu acesso ao mundo “virtual”, principalmente com o surgimento dos leitores de tela que, instalados no computador, auxiliam na escrita e leitura de textos, bem como o acesso ao correio eletrônico e a todos os recursos disponíveis através da internet. A utilização do computador traz maior autonomia para as pessoas cegas, pois através dele podem ler textos sozinhas, digitar seus trabalhos escolares e imprimi-los sem ajuda de um professor de apoio para transcrever sua escrita, como no caso do braille para a tinta.
Existem vários programas leitores de tela especiais para cegos, como o Virtual Vision, Jaws, DOSVOX, etc. Em parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o MEC desenvolveu o aplicativo Mecdaisy, lançado em 2009, que permite a qualquer usuário transformar, de maneira rápida e simples, arquivos de texto em áudio ou ainda gerar documentos para impressão de textos em braille. É uma das mais recentes tecnologias no que se refere a softwares dessa natureza no Brasil. Segundo Oka e Nassif (2010), DAISY (sigla de Digital Accessible Information System) foi constituído na Suécia em maio de 1996 pelas bibliotecas de livros em áudio, liderando uma transmissão mundial de livros analógicos para os chamados Digital Talking Books5 e tem como um dos objetivos principais conferir autonomia a pessoas com deficiência visual, dando-lhes liberdade, inclusive, para criar, imprimir e publicar textos. O Mecdaisy possui versões para Linux e Windows6, o que o torna mais acessível aos usuários, dando-lhes opções de softwares diversos7. Embora o Mecdaisy seja uma tecnologia inovadora, alguns procedimentos de manuseio desta ferramenta ainda não estão muito claros, o que pode dificultar a utilização para alguns usuários.
   Junto aos deficientes visuais, de forma solidária, há trocas constantes de informações para construção do aprendizado e, ao mesmo tempo, muitos estão aprendendo sozinhos a trabalhar com a informática, utilizando-se de recursos disponíveis na internet (apostilas explicativas sobre programas leitores de tela, participação em chat, bem como listas de discussões).
  Devido a este avanço tecnológico, existem inúmeros livros digitalizados disponíveis na internet e acessíveis à leitura dOs programas leitores de telas, inclusive, sites gratuitos que introduzem e facilitam a navegação das pessoas cegas, podem ser de uso das crianças.
   A informática está possibilitando aos deficientes visuais perspectivas de trabalho e de comunicação, aprendizagem e acesso a informações. Como ainda há dificuldade para a impressão e leitura de livros e materiais diversos em braille e também poucos professores que o sabem, o aluno pode usar o computador e, assim, “ler” (ouvir) os textos que serão falados por meio do programa.
  A informática dispõe de recursos que possibilitam ao deficiente visual ter melhores condições de acesso à educação e, consequentemente, possibilita uma melhoria na qualidade de vida, seja através do crescimento intelectual (acesso a informações e educação), pessoal (possibilidade de se comunicar e formas de entretenimento com outros indivíduos em condições de igualdade) e profissional (ter meios adequados  para  desenvolver  uma  atividade  profissional possibilitando a conquista da independência financeira).
   Esses são alguns dos indicadores de que a efetivação da educação inclusiva somente se realizará quando houver um investimento na escola, em instrumentos, ferramentas ou recursos que propiciem às pessoas com deficiências exercício de suas capacidades, a expansão de sistemas de representação e a superação de limites. Estas necessidades devem ser consideradas pela escola que almeja incluir a pessoa com deficiência visual com maiores possibilidades de sucesso.
Considerações finais
  Novas necessidades surgem no decorrer de um trabalho efetivo de inclusão: o envolvimento de todos no estudo e na construção de propostas concretas para o fazer pedagógico; a criação de políticas de fomento para que as escolas e universidades possam ampliar este atendimento; criação de equipe multidisciplinar de pesquisa e produção no campo da inclusão educativa; aquisição de equipamentos necessários para a intensificação do trabalho com os professores e alunos com deficiência visual; realização de encontros com os setores administrativos escolares, para que possam refletir seus fazeres diante desta nova realidade.
  Devemos continuar a investir no desafio que é do educador:  seguir  aprendendo  sobre  o  que  ainda  não se sabe. O  processo de  inclusão  provoca,  produz incertezas e desacomodação que são, concomitantemente, condições necessárias para a produção de ciência na escola e na universidade, um fazer que, no caso, implica no desenvolvimento de uma pesquisa com intervenção, reflexão, escrita e leituras que nos fazem aprender com os novos desafios deste nosso tempo ainda tão marcado por profundas exclusões.

   A inclusão é uma busca, uma construção que remete a um novo modo de convivência, mais encontros do que desencontros entre educadores, e destes com as crianças e com as famílias, encontros que devem se constituir em momentos de “oxigenação” – teórica e prática – e acolhimento. A inclusão convida  todos a participar do novo, a um trabalho de mais autorreflexão enquanto educadores, pois se nos transformamos a cada instante, na convivência podemos construir novos modos de pesquisar-aprender-ensinar..

NOTAS DE RODAPÉ

1 Para fins educacionais, ao se referir à deficiência visual está se fazendo menção às pessoas com cegueira (pessoas cegas), aquelas que apresentam desde a ausência total de visão até a perda da projeção de luz, sendo que seu processo de aprendizagem se fará através dos outros sentidos (tato, olfato, audição, paladar), utilizando o Sistema Braille como principal meio de comunicação escrita e, às pessoas com baixa visão, que são aquelas que apresentam "desde condições de indicar projeção de luz até o grau em que a redução da acuidade visual interfere ou limita seu desempenho", sendo seu processo educativo se desenvolvendo principalmente por meios visuais, ainda que com a utilização de recursos específicos (http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/txt/alunoscegos.txt).
2 As funções psíquicas superiores, a cujo estudo Vygotski dedicou-se, são exclusiva e especificamente humanas, sociais, "artificiais", de origem cultural, internalizadas, construídas sobre a reestruturação das inferiores, que dialeticamente se subsumem nas superiores.
3 Tradução livre: "o conceito (...), como todos os processos psicológicos superiores, não se desenvolve de outro modo que no processo da atividade coletiva da criança".
4 Instrumento para realização de cálculos proposto pela Portaria do Ministério da Educação n. 1.010, de 10 de maio de 2006
5 Livros Digitais Falados.
6 No site do Ministério da Educação o aplicativo pode ser salvo gratuitamente.
7 No site da Fundação Dorina Nowill estão disponibilizados livros em formato Daisy 3.0, gratuitamente.

REFERÊNCIAS
AMIRALIAN, M. L. T. O psicólogo e a pessoa com deficiência. In: BECKER, E. et al. Deficiência: alternativas de intervenção. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1997.
MASINI, E. A. F. S. Intervenção educacional junto à pessoa deficiente visual (D.V.). In: BECKER, E. et. al. Deficiência: alternativas de intervenção. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1997.
MASINI, E. F. S. O perceber e o relacionar-se do deficiente visual: orientando professores especializados. Brasília, DF: Corde, 1994.
BRASIL. Ministério da Educação. Nova tecnologia torna livro acessível para alunos cegos. Brasília, DF: MEC, 23 junho 2009. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index.phpoption=com_content&view=article&id=/index.php?option=com_content&view=article&id=13782. Acesso em 10 ago. 2009.
OKA, C. M.; NASSIF, M. C. M. Recursos escolares para o aluno com cegueira. In: SAMPAIO, M. W. et. al. Baixa visão e cegueira: os caminhos para a reabilitação, a educação e a inclusão. Rio de Janeiro: Cultura Médica; Guanabara Koogan, 2010.
BRASIL. Ministério da Educação. Programa amplia inclusão de pessoas com deficiência visual. Brasília, DF: MEC, 24 junho 2009. Disponível em:<
http://portal.mec.gov.br/index.phpoption=com_content &view=article&id=13786%3>. Acesso em 10/08/2009.
SELAU, B. Inclusão na sala de aula. Porto Alegre: Evangraf, 2007.
VYGOTSKI, L. S. Obras escogidas: fundamentos de defectología. Madrid: Visor, 1997.


Bento Selau é professor pela Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA), mestre em Educação e doutorando em Educação pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Professor das disciplinas de Educação Especial e Inclusão e Psicologia e Aprendizagem.
Carlise Inês Kronbauer é graduada em História pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (UNIJUÍ).
Priscila Pereira é graduanda em Pedagogia e bolsista de iniciação científica pela Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA).

Fonte: Revista Benjamin Constant, Edição 45, Abril 2010

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